sábado, 27 de abril de 2013



Quem sou eu?
Sérgio Augusto Sardi (Professor de Filosofia da PUCRS)

O olhar nos fundos dos próprios olhos em um espelho pode causar vertigens. Através dos olhos, e além deles, a imagem aponta para algo imenso e invisível. E, talvez possamos sentir que a nossa presença no mundo é a fonte de uma imensa interrogação.
Afinal, quem sou eu mesmo???
As palavras vibram, são ditas com intensidade. Ora, não são apenas palavras. Ali, diante de nós mesmos, não há mais como esconder: somos o próprio mistério. Em cada um de nós a existência se apresenta como um mistério. Um mistério vivo: eu mesmo, você. Singulares e belos são os momentos em que o silêncio nos interroga e faz pensar. Repentinamente, abre-se então uma direção a seguir, e inicia-se uma aventura. A aventura de ser eu. A aventura de ser você mesmo, único.

Caminho de volta
Lembremos disto com carinho: cada um de nós é único. Sentir-se único é algo imenso. E faz sentido saber que, sendo assim, cada um de nós representa uma possibilidade única da própria humanidade. Mais uma vez, não apenas palavras: é preciso fazer o caminho de volta para a minha vida, para a sua vida, para o viver de cada um, para se saber único.Pois o viver é isto que, por mais que possamos falar a respeito, permanece não dito.
A vida é sempre mais, infinitamente mais que tudo que possamos dizer a seu respeito. Nós mesmos somos assim. E é este encontro com o silêncio que nos conduz além. Pois ao encontrar o limite do dizer, e ao enfrentar este limite por tocá-lo bem de perto, talvez seja preciso inverter a direção do pensar: em vez de ir de palavras já prontas para dizer a vida, em vez de reduzir o mundo às palavras já dadas, voltamos ao lugar onde a significação da palavra nasce, no qual tudo é novidade.
E cada vez que nos olharmos em um espelho, bem no fundo de nossos olhos, talvez possamos nos ver como uma incessante novidade. Cada momento da vida é também uma novidade.
Pode ser, então, que eu não seja simplesmente eu, e que você não seja simplesmente você. Mas que eu esteja me fazendo, e que você esteja se fazendo. E que sejamos também a força de nos fazermos, de nos inventarmos, de inventarmos sentidos às coisas e à vida, em nossa própria diferença de um modo único. Deve tratar-se de um ato de amor.

Quando amamos alguém, esta pessoa se parece única para nós, ela se diferencia de todas as outras. Deve ser assim com nós mesmos, ao encontrar e criar e amar aquilo que nos faz únicos. Trata-se de amar a nossa própria diferença, a nossa própria loucura de sair do padrão para poder dar a si mesmo um presente: viver com alegria, aumentando-se em suas potências, e vislumbrar uma direção para seguir.

Saber escolher:
A alegria é um modo de olhar para a vida e para si mesmo diante da vida, por desejá-la tão intensamente a ponto de nos lançarmos na conquista de nós mesmos. Para nos fazermos, para nos habilitarmos a sentir o sentido da vida.... Trata-se da coragem de dizer sim para cada dia que se inicia, para cada momento. De sentir o infinito valor do tempo que passa e alcançar a possibilidade de ver a beleza e o bem de existir. A enorme beleza e o bem de simplesmente existir. A enorme beleza e o bem de simplesmente existir. Mas este não é o caminho mais fácil, e pode requerer um enfrentamento interior. Mas é ao nos enfrentarmos, é ao ultrapassarmos nossos próprios limites que nos reconhecemos, que sabemos do que somos capazes, que nos fazemos.
Mas não nos fazemos sós. Em nós habitam aqueles que amamos. Eles talvez possam ser encontrados em algum gesto, em algum prazer que aprendemos ou desaprendemos (pois é preciso aprender o prazer, e também desaprender, pois para podermos nos fazer é preciso aprender a discernir quais os prazeres que nos convém, quais os prazeres que fazem sentido em nossas vidas). Cada um de nós é habitado por suas relações amorosas. Somo feitos de ligações. E, cada um de nós também habita as ligações amorosas daqueles que nos amam ou que nos amaram.
Cada um é único, e também uma multidão. E este único talvez seja o modo como esta multidão vai se fazendo você mesmo. Onde o outro passa a ser você mesmo. E colocar-se no lugar do outro reverbera no encontro do outro em você.
Sendo assim, a pergunta quem sou eu? Transforma-se nessas outras: Quem eu me fiz, quem eu estou me fazendo? Quem eu estou escolhendo ser? Pois em cada escolha, não escolhemos apenas o que vamos fazer ou com quem vamos nos relacionar, mas escolhemos quem vamos ser.


Questões para debate:
1.      Por que é importante perguntar-se: quem sou eu?
2.      Como estou me fazendo? Que escolhas estou fazendo para a minha vida?
3.      Pesquisar sobre o contexto em que o filósofo Sócrates disse: “Conhece-te a ti mesmo”.
4.      Analisar a frase de Heráclito de Éfeso: “Ninguém entra no mesmo rio uma segunda vez, pois quando isto acontece, já não é o mesmo. Assim como as águas já serão outras”...

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